segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O Espaço, o Tempo e o Silêncio

No Sábado à noite eu tomava um café com dois ou três amigos num pequeno bar da minha pequena cidade quando, a meio da conversa, surgiu um desconhecido que, afinal, era amigo dos meus amigos. O desconhecido juntou-se e, sem eu me lembrar como, começou a falar do quanto tinha sido estranho quando se mudou de Lisboa para a minha pequena cidade. As pessoas eram lentas, tudo era lento e o tempo, afinal e para seu espanto, parecia existir e ser uma realidade tão palpável quanto tu e eu. O desconhecido continuou, acabando por confessar que quando um dia mais tarde voltou a Lisboa, e já habituado há existência do tempo, decidiu parar e ver as pessoas. Tolhado, percebeu por onde se solta o tempo de Lisboa:  "Parado, eu só via pessoas a correr! Toda a gente com pressa, para aqui, para ali, e eu a pensar para quê?", confessou.
E eu. Lembrei-me. Que.
Uns dias antes eu saí de casa à noite para ir despejar o lixo e, por acaso, olhei para o céu. No céu reencontrei as estrelas que há muito tinha perdido. Talvez porque o brilho das estrelas que nos chega já existiu há muito muito tempo atrás e nas grandes cidades, como já sabemos, o tempo, afinal, parece não existir.
E eu. Lembrei-me. Que.
Há uns meses, lá para Maio, li o livro do Miguel Sousa Tavares, "A história não acaba assim" (Clube do Autor, 2012). Por acaso, foi sentado numa cadeira na varanda, a olhar para o espaço, a compenetrar-me com o tempo e a conversar com o silêncio, que li o seguinte excerto:
 ".....peça de caça tomba no chão. Não imaginava as longas caminhadas por cabeços ou planícies, por leitos secos de rios ou através da água, o cheiro a esteva e a giesta, ou as longas emboscadas, atento a todos os ruídos, ao simples agitar de uma folha, adivinhando a presença próxima dos animais antes de os ver. As esperas silenciosas à beira de um riacho, molhando a cara na água cristalina, aproveitando para colher poejos ou beldroegas tardias, aproveitando para pensar na vida, no essencial, no que verdadeiramente importa. A sós, com os três maiores luxos que um homem pode ter: espaço, tempo e silêncio. Porque aqui não há multidões nem urbanizações turísticas, não há pressa nem vozearia de conversas inúteis."
E eu. Lembrei-me. Que.
Recuando umas semanas, tinham já brotado os primeiros sinais de Primavera e eu decidi sentar-me perto daquilo a que costumamos chamar o meio do Nada. O dia estava bonito, daqueles que sabemos que não podem ser outra coisa além de uma belo dia de Primavera. No meio da fruitiva inspiração do vento e da uma suave fragrância diluída no ar pensei na minha sorte. A minha respiração era também ela parte do silêncio, o meu corpo parte do espaço e a minha essência parte do tempo. Recordei o que se costuma dizer: que isso, não é nada mais nada menos, do que estar no meio do NadaPorque é na cidade que temos Tudo. E questionei-me se será assim mesmo? Se assim for, na cidade, teremos também o espaço, o tempo e o silêncio? A resposta parece-me evidente. Não temos nós, no meio daquilo a que chamamos o Nada, o Tudo, e não temos nós no meio daquilo a que chamamos o Tudo, um grande Nada?
Não sei se na nossa limitada compreensão será, alguma vez, exequível  entender verdadeiramente o espaço, o tempo e o silêncio. Mas arrisco que para entender o tempo é preciso o silêncio, tanto quanto para entender o silêncio é preciso o tempo. E o espaço? O espaço será provavelmente o lugar onde poderemos combinarmo-nos tanto com o silêncio como com o tempo, será o elemento agregador e alicerçador. Por outras palavras, será o lugar do Tudo.

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