domingo, 27 de maio de 2012

Da janela do meu pequeno-almoço

Estava sentado a tomar o pequeno-almoço. Enquanto levava um pedaço de torrada à boca, prendia-me à figura apetecível, reproduzida no individual, que ocupa lugar na mesa desde o jantar de ontem. Uma fotografia trabalhada de um cesto de frutas, que desperta um desejo maior do que aquele das torradas. Mantenho, religiosamente, os pequenos-almoços invariáveis. Fiéis. Há, em mim, uma parte que não se deixa vencer, e que permanece imutável, obediente a mim próprio, que, até hoje, e independentemente de todos os sítios onde já vivi, resiste. Sentei-me na ponta da mesa. Assim, do outro lado, enquanto mastigo, posso olhar pela janela. Gosto muito de olhar pelas janelas. As janelas são a montra do mundo. Nós estamos de um lado e o mundo do outro. Isto é o que acontece às pessoas grandes. Quando já somos grandes sentimos que do nosso lado, o de dentro, há tudo. Quando ainda somos pequenos, crianças, sentimos que do outro lado, lá fora, há tudo.
As janelas do apartamento correm a toda a largura. Lá fora, e a partir da posição em que estava, sentado, apenas podia adivinhar a cor do dia e, a outra torre, a gémea desta. Entretanto vi o Saramago a aparecer do meu lado esquerdo. Saiu da cozinha e estava a comer um iogurte, como come, aliás, todas as manhãs. Adivinho uma resistência igual à minha. Colocou-se com um cotovelo sobre o parapeito da janela. Com o outro braço continuava a comer o iogurte. Olhava lá para fora. Hoje o dia já tem algum azul, disse o Saramago. Entretanto do meu lado esquerdo apareceu o Nuno. Também vinha a comer. Comia um iogurte e uma sandes. Deve ter ficado curioso, porque também foi colocar um cotovelo sobre o parapeito da janela. E, com o outro braço continuava a comer o iogurte. Disparou uma fotografia na minha cabeça: nos opostos da janela o Saramago e o Nuno de cotovelo sobre o parapeito a comer iogurte e, depois, ao centro, estava eu, sentado na cabeça da mesa, a comer torradas. Eles inclinavam a cabeça para baixo. De vez em quando, também gosto de espreitar pela janela dos outros. Adivinhei que observavam o pátio da piscina, que está, entre a nossa torre e a outra torre, a gémea. Durante os últimos dois dias a piscina esteve fechada porque cá esteve muito vento. Do nosso décimo segundo andar desenhava-se o caos de cadeiras e de espreguiçadeiras desarrumadas pelo vento. Até um banco estava dentro da piscina.
O pequeno-almoço é, certamente, dos momentos do dia mais parecidos com aqueles que tinha em Portugal e, que sempre tive, em qualquer outro lugar. Duas torradas e um copo de leite, ou, então, uma taça de chocapic. Poucos outros momentos sou capaz de segurar e de manter íntimos. Quando chego a um novo lugar há, sempre, um tempo para me adaptar. Já estou adaptado a adaptar-me. Quanto ao Saramago e ao Nuno parece-me que ainda estão a aprender a adaptarem-se. Ambos são mais velhos do que eu. Ambos são casados e têm filhos. O Saramago tem uma filha. O Nuno, acho que, tem uma filha e um filho, não tenho a certeza. Sei que o Saramago tem saudades. Fala constantemente na mulher e na filha. Já marcou férias para não faltar ao aniversário da Joana, a filha dele. O Nuno também deve ter as suas saudades, mas guarda-as. O Nuno é reservado. É a primeira vez que estou a dividir um apartamento com pessoas de gerações diferentes da minha. O Saramago tem cinquenta e cinco anos e o Nuno tem quarenta. Eu estou nos trinta. Três gerações. Incrivelmente, ou não, eu sabia que a opção certa era ficar com eles. Já subsiste, neles, um valor de compreensão, de harmonia, de sensatez e de paz que, nos homens, só se atinge com uma certa idade. Eu encaixo, talvez, e apenas, por um certo modo de discrição.

Credits: http:\\www.peggihabets.com

O Saramago continuava a olhar pela janela. Estava a rapar o frasco de iogurte. Ele gosta mesmo daqueles iogurtes. Estava vestido com umas calças cinzentas e uma camisa que não sei a cor. É daquelas cores que nunca sabemos bem o nome, é um azul marinho ou verde marinho. Enquanto acabava o meu pequeno-almoço olhava para duas pessoas que, também, estão longe. Que, também, não querem estar aqui. Que querem voltar. Já sabemos que é duro. Já sabemos que estamos longe de tudo. Longe de tudo o que é importante para nós. A vida é longa. Às vezes pensamos que não, que é curta. Mas estamos enganados. Estaremos? A vida é longa e custa até ao fim. O Saramago tem cinquenta e cinco anos. Já trabalhou quase toda uma vida. Já se esforçou para estar na sua tranquilidade. Também o meu pai. Também o teu. E agora começa qualquer coisa de novo. E é igual para mim ou para ele, não interessa a idade, não interessa nada, mais nada. A vida, não a nossa, a vida à nossa volta, esse Ser superior e estóico, poucas vezes se lembra das batalhas que já lutámos. E nunca sabe a nossa idade. Pensam vocês que estão livres? Pensam vocês que podem descansar? Não se enganem. Quando somos grandes estamos nas mãos do mundo. E ele, o desumano, agarra-nos e mantém-nos firmemente sufocados, esmagados, numa mão do tamanho do mundo. Sim, do tamanho do próprio mundo. Asfixiados, não resistimos. Tombamos. E, depois, tomamos uma decisão sepultada de mesquinhez. À minha frente, de cada um dos lados da janela, corrida a toda a largura da nossa sala, estavam dois olhares. E vi nos olhos de alguém, o medo de perder. O medo de perder o sentido de todas as batalhas já ganhas. Uma mesquinhez que, profanada, se eleva a jeito de abnegação. Continuei a comer as minhas torradas. O Saramago acabou de comer o iogurte e voltou para a cozinha. O Nuno continuava a olhar lá para fora, para a piscina. E lá fomos nós começar mais uma semana de trabalho. Esta semana é a última para completar um mês. As manhãs já são de menos birra e de mais resignação. Se eu tivesse na posição deles também viria para aqui. Porque lutaria para que não fosse a minha mulher ou os meus filhos a virem. Porque lutaria por eles. Então, o que estou, eu, aqui a fazer? Isso. Isso, não vos contar. Mas, sobre eles, eu sei e não preciso que eles me digam. Eu sei que eles lutam para que os seus filhos, possam ter um sopro de esperança em ter o mundo nas mãos. É por isso que eles aqui estão. Já está longe. Já está longe o tempo em que tínhamos o mundo nas nossas mãos. E, sabemos que nunca mais o teremos. Porque, só quando se é pequeno, se atinge tal sabedoria. Há coisas ininteligíveis aos adultos. Esta é uma delas. Quando somos pequenos temos o mundo nas nossas mãos. As crianças não têm dúvidas. As crianças sabem o que querem. Eu sabia o que queria. Entre mundos, acabei as minhas torradas. Peguei no tabuleiro, onde assentavam as migalhas de torrada, e fui até à cozinha. Arrumei as minhas coisas, incluindo a marmita, a fruta e as bolachas para o lanche. Voltei ao meu quarto, que fica ao fundo do corredor. Lavei os dentes. Verifiquei se deixei alguma coisa de valor à vista no quarto, porque as empregadas vêm sempre ao Domingo, às terças e às quintas. Hoje é Domingo. Quando sai, já o Saramago e o Nuno tinham saído. Eles saem sempre primeiro. Eu saio sempre depois. Tranquei a porta do nosso apartamento. Desci, pelo elevador, os doze andares que me separam do mundo da terra. Fora do edifico já lá estava a carrinha para nos transportar. De longe recortei duas silhuetas sentadas, para além do condutor. Eram o Saramago e o Nuno. Foram os primeiros a chegar. Nesse momento parei à porta do edifício. Observei o Saramago, sentado dentro da carrinha, a contemplar o mundo pela sua janela. De vez em quando, também gosto de espreitar pela janela dos outros. Mesmo longe identifiquei um olhar remoto, distante. Olhava para o outro lado, não me via. Do outro lado via-se o mar. Estava pintado daquela cor que ainda não sei o nome, se azul marinho, se verde marinho. Mas eu sei que ele estava para além do mar. Eu sei que ele estava dentro do seu mundo, protegido pela sua janela, com as pessoas de quem sente saudade. Porque, quando já somos grandes sentimos que do nosso lado, o de dentro, há tudo. E depois, dentro desse mundo dele, devia haver alguém mais pequeno, por quem ainda vala a pena lutar. Porque, quando ainda somos pequenos, crianças, sentimos que do outro lado, lá fora, há tudo. Se somos grandes estamos nas mãos do mundo. Se somos pequenos temos o mundo nas nossas mãos.

sábado, 26 de maio de 2012

O colar de pedras

Sobre a minha secretária, encontrei um fio de colar. Não sei de quem é, nem quem o confiou. Sob o fio, um bilhete. Não reconheci a letra. Peguei-o e li:
"Encontra as tuas pedras e constrói o teu colar. Guarda-o. Com ele, saberás o que realizar."
Interroguei-me. Enveredei por um exercício de meditação que me forneceu algumas respostas. Mas. Mas faltam-me as palavras. Faltam-me sempre. Descobri uma razão entre as pedras e as palavras. Descobri uma razão entre um fio de colar e a essência de escrever. E, não consegui evitar em questionar-me:
Será hoje? Será hoje que vou escrever alguma coisa? Será hoje que vou escrever alguma coisa que te diga alguma coisa, que nos diga alguma coisa, que vala, pelo menos, alguma coisa? Não. Bem sei que não. E sei que, será sempre, e sempre, não. Faltam-me as palavras. Faltam-me sempre. E continuo a remoer-me se algum dia conseguirei reunir um conjunto de palavras que num todo façam algum sentido, que nos ensinem alguma coisa? Mas não tenho nada para ensinar. Como posso ter? E no entanto, sei que, voltarei, sempre, ao empreendimento de descobrir as palavras. Como aqueles que procuram as pedras. As pedras para fazer um colar. Mas não tenho nada, sou um saco vazio de pedras. Na minha rua não devem haver pedras.

Acabei de ler uma crónica do António Lobo Antunes. Acabei de ler uma crónica do José Luís Peixoto. Fiquei a pensar. Fiquei a pensar que me apetece unir um conjunto de palavras como se unem as pedras polidas num fio de colar e, depois, se vendem numa barraca de feira. Numa barraca de feira, por que é o que elas valem. Se, mesmo isso valerem. Com alguma sorte, talvez te contem alguma coisa, talvez me contem alguma coisa. Talvez, um dia, consiga reunir um conjunto de pedras coloridas.
Levantei-me, aqui, longe de vocês. Porque quando começo a pensar preciso de andar. Sim, levantei-me só para pensar. Comigo levei o meu fio de colar. Suspenso pelos mesmos dedos que lhe procuram palavras. Deixei-me andar, para algum lugar, para lugar algum. Nunca sei qual. E pensei que, aqueles que escrevem, convergem. Talvez num beco, talvez numa armadilha. Todos pensamos que nos enganamos a pensar. Por vezes, pensamos que não nos iludimos, o que por si, já é uma ilusão. E depois penso que todos paramos. Será que, todos, como eu, param? Como que, se para pensar, fosse condição cessar. Voltei-me a lembrar das crónicas do António Lobo Antunes e do José Luís Peixoto. E assusto-me com a facilidade das palavras deles. E assusto-me com o sentido; com a clareza; com a imaginação. E assusto-me com a veracidade, com a sinceridade. Porque a veracidade e a sinceridade alimentam o coração da escrita, são como uma caixa de pedras preciosas. Uma caixa que, ao abrir-se, reflecte a luz que lhe incide. Ilumina. Alimenta-se da luz exterior, como as palavras se alimentam da nossa envolvência. E se nascerem de um brilho de luz espontâneo, natural, serão belas. Serão diamante,  serão rubi, serão safira, serão esmeralda. É o mais fácil para mim, para eles. E para ti? Porque não é preciso inventar, ludibriar, imaginar. É o mais fácil. É o que existe, o que vejo, o que sinto. É o que me acontece, o que te acontece, o que nos acontece. É onde estou, onde estás, onde estamos. É tudo.
Estava parado quando senti qualquer coisa a escapar-me da mão. Seriam palavras? Não. Era um fio de colar, que, alguém, não sei quem, deixou em cima da minha secretária. E recordei-me das sutis palavras escritas naquele bilhete de colar:
"Encontra as tuas pedras e constrói o teu colar. Guarda-o. Com ele, saberás o que realizar."
Foi, então, que voltei-me a lembrar daqueles que escrevem. Concluí que o José escreve, as crónicas, em forma de poesia. E o António, o que escreve o António? Não sei, quem sabe, tu sabes? Mas escreve qualquer coisa, que de certo é uma crónica, por que também me faz pensar. E não me interessa como escreve. Interessa-me se gostei, se aprendi. E depois? E depois voltei ao meu lugar. Na verdade tudo o que pensei enquanto andei, nada, mesmo nada do que pensei, escrevi. Tenho na mão um fio de colar sem pedras. Pelo caminho encontrei algumas, mas são apenas, e apenas, pedras sem brilho. De qualquer rua, de qualquer lugar, mas de nenhum especial. Se preciosas encontrei, já as perdi. Perdi o melhor. Assim me iludo. Coloco as pedras de rua no meu fio de colar, mas não condizem. Uma lisa, outra enrugada. Uma redonda, outra disforme. Uma diáfana, outra opaca. E coloco-as no meu fio de colar, que, alguém, não sei quem, me deixou em cima da secretária. Tento convencer-me que conheço um lugar de jazida que só eu sei onde existe. Convenço-me que a culpa é sempre, e sempre, de nunca ter comigo um saco, como se as palavras preciosas só se encontrassem quando não as posso escrever, quando não tenho um saco para as guardar. É por isso que nunca tenho pedras preciosas. Ficam lá, para outro. Por vezes, consigo esconder uma ou duas no bolso. Mas não passam de espinelas, logros de diamante, logros de safira. E com essas, por vezes, ludibrio um, ou dois de vós.Perderemos todos, nós os que escrevemos, sempre o melhor? Será que eles também perdem? Porque, como vos disse, só sou capaz de escrever com veracidade, sinceridade. Este momento, não o outro. O outro já foi. Só assim sou natural. E procuramos, todos, escrever com caneta a cor de diamante, a cor de safira, de rubi, talvez esmeralda. E de repente. E de repente sinto palavras que disparam de dentro, atingem-me como pedras. São pedras. A impulsividade. A fidelidade tingida pela impetuosidade das palavras. E não me controlo. E não as controlo. Só assim consigo escrever. Porque, quando penso, não sou capaz de escrever, senão perco. Perco os pensamentos. E eles? Será que eles pensam? Não sei. Iludo-me que teremos qualquer coisa em comum. Uma forma qualquer de estar, de fazer, ou, talvez, de ver? Há qualquer coisa que não quero admitir, que não posso admitir. Porque como já vos disse, não sei. Não sei nada, não tenho nada para ensinar, para contar. Nem saberia escreve-lo, se o tivesse. Eles têm. Eles sabem. Pergunto-me o quanto terei do que eles têm? Se é que tenho alguma coisa. Talvez. Talvez tenha, mas nunca o vou admitir, nunca o poderei admitir, porque não tenho. Não as tenho. Faltam-me as palavras. Faltam-me sempre.

sábado, 19 de maio de 2012

Pelas Arábias - Doha, Qatar - os primeiros 15 dias


Volto a envolver-me numa malha a preto e branco. Eles de branco. Elas de preto. O jogo do preto e branco. E depois, como se tivéssemos saido de um filme a cores, estamos nós. Uns de verde, outros de amarelo, outros de azul, castanho, vermelho e tantas outras cores como todas as outras que não sabemos sequer o nome e que por vezes discutimos, por exemplo, se é verde marinho ou azul marinho.
Aqui estão as primeiras fotos da minha estadia em Doha, Qatar.
A primeira noite num hotel












ainda no hotel: o nosso almoço anunciado como jantar :)















O primeiro passeio e jantar pelo Souq




o restaurante do primeiro jantar no souq




















A mudança para os apartamentos


as primeiras compras!!!


A visita ao museu de arte Islâmica
a vista do museu para a marginal de Doha

a vista mesmo à entrada do museu







onde está o Wally?




à saída do museu

ainda vou aprender a tirar estas fotos!



A experiência árabe de um jogo de futebol.


A final da Emir Cup, qualquer coisa como a final da taça de Portugal...... não anguentámos. O jogo é tão entediante que todos saímos antes do fim.
uma adepta do Al Sadda

uma adepta do Al Gharrafa - nós também estávamos a torcer pelos da garrafa, pois claro!




E por enquanto é tudo!

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Pelas Arábias - Antes da partida

Lembro-me, muito bem, do dia em que regressei. Lembro-me. Lembro-me de sentir a levidade do ar ao sair do avião. Lembro-me de olhar o céu azul, azul esperança, salpicado de umas quantas nuvens, umas brancas, outras cinzentas, outras brancas e cinzentas. E lembro-me de voltar a sentir a leveza do ar, sustentando-me, porque de onde vim a humidade trespassava-me. Lembro-me de cheirar Lisboa como um bálsamo que me despertou os sentidos. E, lembro-me, talvez, de um sorriso estampado na minha cara, provavelmente apalermada, de umas saudades que já me consumiam. Foi um dia Outonal que me deu as boas vindas. Depois do aeroporto, no caminho para casa, ladeando a estrada descobria-se a terra húmida, molhada, coberta das folhas caídas das árvores, e das árvores despidas das folhas. Lembro-me dos castanhos e dos verdes que me acompanharam. E, quando cheguei a casa, voltei a inebriar-me com a levidade do ar, com a clorofila dos verdes e com o vento cortante da serra. Já não havia dúvidas: regressara a casa!

E agora vou voltar. Sim vou voltar, não exactamente de onde vim, mas, só um pouco, mais ao lado. Nem sempre as razões são óbvias. Nem sempre as decisões são fáceis. Nem sempre sabemos se estamos certos. Não sei. Mas as razões de hoje não são as razões de ontem e, a decisão de hoje está longe dos motivos da decisão de ontem.

Agora resta-me despedir, daquilo que sei, de que me quero despedir. No passado fim-de-semana foram os amigos de Lisboa, no vinte e cinco de Abril foram os amigos de cá, neste fim-de-semana foi a família. Mas, não só das pessoas me despeço. Despeço-me daquilo, que sei, que também me faltará. O fim-de-semana passado foi de Lisboa, da Baixa cosmopolita e dos gelados do Santini’s, de Belém, do CCB e dos pastéis e, sem esquecer o Pão de Ló de Rio Maior.

Nestes dois anos e meio, lá em cima, guardei a minha mala de viagens. Na oca vontade de fazer a mala, subi as escadas para o sótão. À entrada, à direita, um quarto. Entrei. Ao fundo um manto de plásticos zelava por um conjunto de malas de viagem. Facilmente, identifiquei a minha. É a maior. Puxei a mala com o plástico e retirei-o. Ainda apresentava as marcas das minhas duas últimas viagens, os autocolantes de identificação de bagagem. Retirei-os, não sem me avivaram algumas lembranças, que, não queria. Levei a mala até ao meu quarto. Abri-a e. Abri-a e, foi como que, se, lá de dentro tivessem saltado as recordações abandonadas, do dia em que, refolgado, voltei a enche-la com a minha trolha, para voltar. Para voltar do quarto que lá despejei, a vida que recusei. Nesse instante, olhei para o exterior, ansiando encontrar-me de novo por cá. Para lá da janela do meu quarto descortinava-se a terra escurecida pela chuva que, ainda há pouco, caiu. Mais além, um manto de papoilas vermelhas sarapintado de margaridas amarelas relembram-me a pulsação da nossa terra, o latejar inexistente das terras áridas e secas, para onde vou. Aproveitei. Inalei um pouco mais do âmago que me sustém. Embalado por esta distracção abandonei o meu quarto e fui até lá fora. Ao sair, primeiro, senti o vento cortante da serra, aquele mesmo que me recebeu quando voltei. Depois inebriei-me com a clorofila dos verdes, aquela mesma quando voltei. E, depois, voltei a cheirar a terra molhada, que neste dia Primaveril, se mascarou de quadro Outonal, o mesmo que me recebeu quando voltei. Caminhei até ao extremo da varanda. Uma silhueta improvável emergia da vegetação rasteira. Lá em baixo, no sopé da minha casa avistei um cavalo. Um cavalo? Nunca tinha visto um cavalo por aqui? Estaria a alucinar? Estaria a minha imaginação a fabricar um cenário? Seria dos óculos novos? Tirei os óculos e voltei a olhar, com, e só, os meus próprios olhos. Sim, era mesmo um cavalo no sopé da minha casa, lá em baixo, a pastar. Era branco. Parecia velho e cansado de aventuras. Sentei-me numa cadeira, que também nunca tinha descoberto por ali. De onde veio a cadeira? Devia estar mesmo a alucinar. Mas não. Sentei-me. Por uns momentos continuei a observar o cavalo. A sua serenidade assemelhava-se à serenidade daquele dia, e à minha própria. A sua paz aparentava-se à paz que eu só distingo nos ares da nossa terra. Mas de quem era o cavalo? Se eu fosse outro, diria que Deus me tinha enviado um sinal, em forma de unicórnio, uma qualquer revelação sagrada. Mas não. Eu não sou esse outro. Por isso deixei-me. Deixei-me a sentir o toque do vento serrano, deixei-me a cheirar as flores que desabrochavam no topo de uma terra molhada e, deixei-me a escutar os pássaros que sempre trauteiam com a Primavera. E, por último, prendi-me a sentir a levidade do ar e, a observar o céu azul, azul esperança, salpicado de algumas nuvens, umas brancas, outras cinzentas, outras brancas e cinzentas, sustentando-me. Fiquei, até não me cansar. Porque sei. Porque sei que, tal como quando voltei, sentirei, de toda esta essência, saudade.

Espero contar-vos, aqui no meu blogue, como vão as coisas por lá. Podem ir acompanhando. E resta-me dizer-vos o que de mais importante levo na minha mala. Não, não é o cheiro da terra molhada, o vento da serra, a clorofila, e uma manta de nuvens, dentro de uma garrafa. Adeus, e até breve.



No que respeita a escritores portugueses, em primeiro lugar, destaco José Luís Peixoto. Dele, para além de um livro gratuito publicado pela revista Sábado, acompanho as crónicas no semanário Visão. 








Um outro escritor português, de quem nunca nada li, mas que, apesar da sua juventude, há já alguns anos, é referenciado muito positivamente pela crítica.









Por último, um, ainda mais jovem, escritor português.










Na literatura estrangeira, o inevitável Kundera.









De autores estrangeiros, mais um livro, baseado em factos verídicos,  da professora Torey  Hayden, sobre alunos com necessidades especiais, ou oriundos de famílias problemáticas ou grupos sociais desfavorecidos.











Na categoria de História, elegi três livros.
Este já conhecem mas, ainda, não o li. Para entrar dentro da guerra.










E depois da Guerra....... também há sempre uma História para contar. Este livro é um comentário e uma análise ao século XX europeu, depois do termino da segunda guerra mundial. Tudo o que a Europa se tornou.








E, por fim, de guerra, um depoimento verídico daquele que é considerado o relato mais profundo e mais esclarecedor de um judeu, prisioneiro num campo de concentração.









Se ainda sobrar tempo, antes de regressar nas férias, para espicaçar a imaginação e o coração de criança, uma aventura de Júlio Verne.









E,confesso que, não gosto de livros demasiado descritivos, talvez me sobre coragem para ler o nosso clássico.

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